terça-feira, 20 de abril de 2010

O Medo

Estava escuro, somente a luz saída da velha televisão iluminava a sala fria. Vidrada no ecrã resplandecente, atirou a mão à taça que tinha entre as pálidas pernas e tirou um amendoim que viria a trincar com força. Nesse mesmo instante, pelo canto do olho, viu um vulto passar abruptamente no corredor. Sobressaltada, agarrou com força a manta turquesa e escondeu-se debaixo dela. Respirava ofegantemente, sentia o coração a sair-lhe pela boca, as mãos tremiam. Sussurrava, como se tivesse medo que o vulto a ouvisse, “Tem calma, relaxa, não foi nada”. Ganhou coragem e destapou-se. De peito para fora, acendeu uma vela que, com a sua grande e flamejante chama, iluminava toda a gélida sala. Percorreu todo o espaço, de pé descalço, olhos frenéticos e corpo rígido. Desejava encontrar os móveis da casa e as suas paredes, nada mais. Já não ouvia o som da televisão, ouvia apenas o bater do coração que batia o compasso da assustadora e barulhenta melodia que a seguia. Sentiu uma aragem que lhe fez arrepiar e levantar os finos pêlos dos braços. Receou olhar para trás, mas fê-lo, convicta de que não iria ver nada para além do espelho pendurado na parede tingida de vermelho e o seu reflexo no vidro. O seu reflexo lá estava, tal como o reflexo da pequena chama da vela, mas algo estava diferente. Ela sentia as suas mãos a tremer, mas o seu reflexo permanecia imóvel. Os olhos que ela via reflectidos eram integralmente negros e admiravam-na friamente. Assustada e vacilante, perguntou “Quem és tu?! O que queres de mim?!”. O reflexo dos seus olhos continuavam a admirá-la friamente e da sua própria boca saíram as palavras “Se receias o teu próprio reflexo, como é que consegues encarar os demónios dos outros que te rodeiam?”. Sentiu uma lágrima a escorrer do seu olho esquerdo e jogou a mão para limpá-la. Olhou para a mão e viu que o líquido era vermelho. Soltou um grito do fundo do peito que a ensurdeceu.
Ao cair de joelhos no chão, abriu os olhos e viu a luz da velha televisão, que a ofuscou. A taça de amendoins continuava entre as pálidas pernas e o amendoim que tinha tirado permanecia intacto entre os dedos da mão, à espera de ser trincado.

Beatriz Madeira; 11º C

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