segunda-feira, 12 de abril de 2010

Saudade de Viver!

Conversam duas mulheres já de certa idade, sentadas num banco de jardim, desabafam o que sentem, entristecem-se com a tristeza uma da outra e, no meio de tanta tristeza, conseguem encontrar a alegria. Amália já tinha sessenta e oito anos, a idade levara-lhe toda a sua juventude e deixara-lhe, na cara e nas mãos, as marcas de uma vida complicada e cheia de trabalho. Conceição celebrara uma semana antes os setenta anos, o seu aspecto não escondia a idade que tinha, como se em cada ruga se contassem os anos e se lessem as dificuldades por que passou na vida. Continuaram ali, no banco de jardim, mesmo no centro da Quinta dos Chafariz, em Santiago do Cacém.
Amália: Como é triste olhar para mim e ver que toda a vida já me passou ao lado…
Conceição: Não digas isso, mulher, se a vida já te passou toda ao lado, então o que sou eu? Apenas uma memória?
Amália: Nem isso… Somos memória até se esquecerem de nós…
Conceição: Desde a morte do Manel que já ninguém se lembra que existo, só nos temos uma à outra…
Amália: E assim morreremos mulher, e assim morreremos…
Conceição: Já nem a morte se lembra que existo!
Amália: Essa nunca se esquece, quando menos esperarmos ela atacará!
Conceição: Esqueceu sim… Se não se tivesse esquecido já tinha vindo buscar-me… Que faço eu aqui? Uma velha que já não presta para nada… Já não tenho mãos para trabalhar, já não tenho forças para correr nem saltar, não tenho cara para encantar, e desde que o Manel se foi, já não tenho coração para amar…
Amália: Credo mulher! Não me diga que queria voltar a amar com esta idade!
Conceição: Nem que fosse amar a vida, mas já nem essa eu amo… Já não sei amar…
Amália: A minha mãe sempre me disse que enquanto amarmos, teremos a certeza de que estamos vivos, mexe o coração e, assim, temos a certeza que não somos corpos mortos…
Conceição: Ainda bem que mo dizes mulher, se não amo não existo, não é verdade?
Amália: Segundo a minha mãezinha que Deus tem, sim!
Conceição: Então parece que a morte não se esqueceu de mim…
E ali ficaram a tentarem perceber o porquê de ainda não terem partido para o outro mundo…

João Pedro Rocha; 11ºD

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